Caros leitores e leitoras,

 

pela terceira vez, a jornalista norte-americana Abigail Shrier aparece em nosso site. A primeira foi quando publicou sua obra mais famosa, “Danos Irreversíveis”, e publicamos uma resenha feita pela psicóloga brasileira Carolina Rabello Padovani. A segunda vez foi quando traduzimos o depoimento da própria Abigail sobre a censura que sofreu e que lembra a queima de livros da Idade Média. Neste mês, trazemos a entrevista que ela fez com dois dos mais proeminentes nomes da indústria da “identidade de gênero”: “Marci” Bowers, cuja especialidade médica é a cirurgia plástica, e “Erica” Anderson, da psicologia; “Marci” foi responsável pela castração cirúrgica de Jazz Jennings (foto abaixo), que foi a “criança trans” mais famosa do mundo. Ambos são homens que se autodeclaram “mulheres trans”. A entrevista foi originalmente publicada no site Common Sense (“Senso Comum”) e, por precaução, nós a salvamos também num link do Web Archive.  

A entrevista, à qual adicionamos notas de rodapé feitas pela nossa equipe, confirma aquilo que nós e outras pessoas (lamentavelmente, raríssimos médicos) dissemos por tantos anos e que era considerado “transfobia”: que eufemismos como “mudança de gênero”, “transição de gênero” e “afirmação de gênero” escondem a prática de castração química e cirúrgica em crianças, adolescentes e adultos, danificando suas funções sexuais e reprodutivas antes mesmo que tenham a oportunidade de vivenciar uma vida sexual e afetiva plena. Tristemente, o Brasil é um dos que permite que isso seja feito em ambulatórios de “identidade de gênero”, sob o silêncio conivente da classe médica, terapêutica, dos políticos, militantes, acadêmicos.

É impossível que um médico e um psicólogo desconhecessem que danificar partes íntimas e suprimir a libido prejudicam a vida sexual e reprodutiva em sua plenitude. Acreditamos que estes profissionais apenas se deram conta dos escândalos e processos que virão; são “ratos abandonando o navio”.

É lamentável que a imprensa brasileira e internacional tenham sido cooptadas por essa indústria. Você sabe que não vai ler tão cedo entrevistas como estas no O Globo, na Revista Crescer, no Instagram do “Mães pela Diversidade”, nas lives conduzidas por profissionais da “saúde LGBTQIA+”. Pelo contrário: o Globo, por exemplo, reforça o discurso “trans” tão incessantemente que suas matérias parecem um “copia e cola” de releases; sequer se preocupam em convidar um (a) profissional para apresentar um contraponto. Exemplo disso é a notícia, em agosto último, com o apelativo título “Crianças trans têm o nome social negado, e famílias lutam por direito” (link para assinantes aqui). Não é, ou ao menos, não deveria ser um direito mentir para crianças e conduzi-las num caminho que os próprios especialistas admitirão, conforme você verá adiante, ser “sloppy” (desleixado). A chamada “grande mídia” está atuando assim globalmente: os pais da campanha PITT – Parents with Inconvenient Truths about Trans (“Pais com Verdades Inconvenientes sobre Trans”) denunciaram em seu site que o New York Times não só se recusa a publicar pontos de vista críticos como também apaga comentários de leitores que corrigem informações publicadas pelo jornal.

Bem. Como a imprensa não fará o seu papel, contamos com você para encaminhar este artigo para o maior número de pessoas possível. Pedimos também que tire alguns minutos para enviá-lo aos deputados e deputadas de São Paulo solicitando que aprovem o projeto de lei nº 432/2020, que visa a proibir a hormonização infanto-juvenil no Estado – que abriga o primeiro ambulatório a realizar estas práticas nos corpos de seus jovens pacientes. Solicitamos também que envie também este texto para os parlamentares federais a fim de que dêem andamento ao PDL nº 19/2020, parado desde 13 de abril deste ano. Nossas únicas armas são a verdade e o fato de que somos maiores em número: o dinheiro, a mídia, a academia…praticamente todas as instituições foram cooptadas por essa indústria.

Registramos, por fim, que apesar de confessar os danos causados pelos hormônios bloqueadores aos corpos de meninos e meninas, “Marci” não é contra o uso: após a publicação da entrevista, exigiu que Abigail fizesse constar em um artigo subsequente que considera o bloqueio apropriado para “casos de disforia severa”.

Coincidentemente, enquanto transativistas adultos danificam as funções sexuais de crianças, foi lançado um aplicativo no Google Play chamado “Transgender & Crossdresser Stories” (“Histórias de Transgêneros e Crossdressers”) que traz histórias pornográficas envolvendo adultos, crianças e transgenerismo. Conforme denunciou o site 4Pub,

“Uma história chamada ´Um menino de cabelo comprido´, classificada como conteúdo de sexo explícito, detalha como dois homens mais velhos convencem um menino a se travestir e até a fazer sexo oral neles, orientado por sua mãe. ´Michael, querido, você daria uma menina linda´, ela diz. ´Por que não dar o próximo passo? Você pode voltar a ser um menino quando você quiser. Você só tem alguns meses para experimentar como é ser uma menina. Quando você chegar ao Ensino Médio, será o fim da oportunidade… Imagina o Will e o Jeff, como eles ficariam se você se parecesse mais com uma menina”. 

Ao alertar acerca do “fim da oportunidade”, a mãe repete o conselho dos profissionais e ativistas que apóiam o uso de hormônios bloqueadores de puberdade: o de frear o desenvolvimento normal dos corpos infanto-juvenis para obterem “passabilidade” na vida adulta, ou seja, “passar” como alguém do sexo oposto. Muitos adultos que se autodeclaram “trans” acreditam que seus problemas se devem ao fato de não conseguirem “passabilidade” – como se homens e mulheres comuns, que “parecem” ser o que são, não tivessem inúmeros problemas também. Nós divulgamos o aplicativo em nosso Instagram, que aliás foi atacado nos últimos dias por uma horda de transativistas e seus obedientes seguidores, muitos deles adolescentes.

 

A medicina baseada em “identidade de gênero” passará para a História como um escândalo de dimensões épicas, muito além do que foram os escândalos da lobotomia, da talidomida e dos opióides . E, considerando a captura que fez sobre as autoridades, enlameará praticamente todas, senão todas, as instituições do Brasil e do mundo.

 

Um grande abraço,

 

Equipe No Corpo Certo.


Doutores trans “top” soam alarme sobre cuidados “desleixados”

Em entrevistas exclusivas, dois proeminentes especialistas soam o alarme sobre bloqueadores da puberdade, cuidados “afirmativos”, inibição do prazer sexual e a supressão do dissenso no seu campo.

A Dra. Marci Bowers realiza uma cirurgia de redesignação de gênero no Hospital Trinada Mount San Rafael. (Glenn Asakawa/The Denver Post via Getty Images)

Durante quase uma década, a vanguarda do movimento pelos direitos dos transgênero – médicos, ativistas, celebridades e influenciadores transgênero – definiu os limites da nova ortodoxia que envolve os cuidados médicos trans: o que é verdadeiro, o que é falso, que perguntas podem e não podem ser feitas. 

Eles disseram que era perfeitamente seguro dar a crianças com apenas nove anos bloqueadores da puberdade e insistiram que os efeitos desses bloqueadores eram “totalmente reversíveis”. Eles disseram que a tarefa dos profissionais médicos era ajudar os menores a transicionar. Eles disseram que não cabia a eles questionar a entendimento pela transição e que qualquer pessoa que fizesse isso – incluindo os pais – era provavelmente transfóbico. Eles disseram que qualquer preocupação sobre um contágio social entre meninas era nonsense. E nunca disseram nada sobre a possibilidade real de que o bloqueio da puberdade, associado a hormônios do sexo oposto, pudesse inibir uma vida sexual normal.

Os seus aliados na mídia e em Hollywood contaram histórias e criaram conteúdos que reafirmaram esta ortodoxia. Qualquer pessoa que ousasse discordar ou se afastar de qualquer dos seus princípios fundamentais, incluindo as jovens que destransicionaram publicamente, era inevitavelmente vilipendiada como hater e acusada de prejudicar crianças.

Mas essa nova ortodoxia foi longe demais, de acordo com dois dos profissionais mais proeminentes no campo da medicina transgênero: Dra. Marci Bowers, especialista em vaginoplastia de renome mundial que operou a estrela de reality shows televisivos Jazz Jennings, e Erica Anderson, psicóloga clínica da Clínica de Gênero da Criança e do Adolescente de São Francisco, na Universidade da Califórnia. 

No decurso das suas carreiras, ambas já viram milhares de pacientes. Ambas são membros do conselho da Associação Profissional Mundial para a Saúde Transgênero (WPATH) (1), a organização que estabelece os padrões mundiais para os cuidados médicos transgênero. E ambas são mulheres transgênero.

No início deste mês, Anderson me disse que submeteu ao The New York Times um artigo de opinião em co-autoria alertando que muitos prestadores de serviços em saúde transgênero estavam tratando crianças de maneira imprudente. O The Times declinou, explicando que estava “fora das nossas prioridades de cobertura neste momento”.

Durante as últimas semanas, falei longamente a ambas as mulheres sobre o direcionamento atual do seu campo e sobre onde achavam que ele tinha dado errado. Sobre algumas questões, incluindo a posição sobre os bloqueadores da puberdade, elas levantaram preocupações que parecem questionar as atuais diretrizes de saúde estabelecidas pela WPATH – que Bowers deverá liderar a partir de 2022. 

A WPATH, por exemplo, recomenda que, para muitas crianças disfóricas e em não-conformidade com o gênero, a supressão hormonal da puberdade comece nas fases iniciais da puberdade. A WPATH tem também insistido desde 2012 que os bloqueadores da puberdade são “intervenções totalmente reversíveis”.

Quando perguntei a Anderson se ela acredita que os efeitos psicológicos dos bloqueadores da puberdade são reversíveis, ela respondeu: “Não tenho certeza”. Quando lhe perguntaram se as crianças nas fases iniciais da puberdade deveriam ser colocadas em bloqueadores, Bowers respondeu: “Não tenho certeza”. “Não sou fã”.

Quando perguntei a Bowers se ela ainda achava que bloqueadores da puberdade eram uma boa ideia, do ponto de vista cirúrgico, ela respondeu: “Isso é típico da medicina. Fazemos zig e zag, e penso que talvez tenhamos feito zig para a esquerda um pouco demais em alguns casos”. Ela acrescentou: “Penso que havia ingenuidade por parte dos endocrinologistas pediátricos que eram proponentes do bloqueio precoce [da puberdade] pensando que esta mágica poderia acontecer, que os cirurgiões poderiam fazer qualquer coisa”.

Perguntei a Bowers se ela acreditava que a WPATH tinha sido acolhedora com uma grande variedade de pontos de vista dos médicos – incluindo os preocupados com os riscos, céticos em relação aos bloqueadores da puberdade, e talvez até críticos em relação a alguns dos procedimentos cirúrgicos?

“Há definitivamente pessoas que estão tentando manter de fora qualquer pessoa que não compre integralmente o alinhamento de que tudo deve ser afirmado e que não há espaço para discordâncias”, disse Bowers. “Penso que isso é um erro”.

Bowers não está apenas entre os cirurgiões de sexo mais respeitados do mundo, mas é certamente um dos mais prolíficos: construiu ou reparou mais de 2.000 vaginas, o procedimento conhecido como vaginoplastia. Ela ascendeu ao estatuto de celebridade aparecendo no programa de sucesso “I Am Jazz”, que cataloga e coreografa a vida de Jazz Jennings, sem dúvida o adolescente transexual mais famoso do país. 

Em janeiro de 2019, Jeanette Jennings deu à sua famosa filha uma festa de “Adeus ao pênis”.  Mais de um milhão de telespectadores assistiram aos convidados se banquetearem com almôndegas e salsichas em miniatura na casa dos Jennings na Flórida, em estilo mediterrânico. A família e amigos aplaudiram enquanto Jazz cortava um bolo em forma de pênis. O procedimento bastante complicado que se seguiu pareceu mais do que um Sweet Sixteen (2)

Por essa altura, Jazz já era o adolescente mais influente da revista Time, co-autor de um livro infantil que foi best-seller e inspiração para uma boneca de plástico. Ela tinha servido como embaixadora da juventude na Campanha dos Direitos Humanos e tinha cerca de um milhão de seguidores no Instagram. A sua história já não era apenas uma história pessoal, mas um anúncio para um estilo de vida e uma indústria. 

No dia do procedimento – devidamente gravado para o Instagram – a irmã de Jazz, Ari, agitou de forma provocadora uma salsicha em frente à câmara. Como Jazz estava prestes a ser levada para a sala de operações, ela estalou os dedos e disse: “Vamos fazer isto!”.

A vaginoplastia a que ela foi submetida é o que os cirurgiões chamam uma “inversão peniana”, na qual os cirurgiões utilizam o tecido do pénis e dos testículos para criar uma cavidade vaginal e um clitóris. Com homens adultos, uma inversão peniana era eminentemente exequível. Com Jazz, era muito mais difícil. 

Como milhares de adolescentes na América tratados para disforia de gênero (desconforto grave com o sexo biológico), Jazz tinha sido colocada nos bloqueadores da puberdade. No caso de Jazz, eles começaram aos 11 anos de idade. Assim, aos 17 anos de idade, o pênis de Jazz era do tamanho e maturidade sexual de uma criança de 11 anos. Como Bowers explicou a Jazz e à sua família antes da cirurgia, Jazz não tinha pênis e pele escrotal suficientes para ela trabalhar. Assim, Bowers pegou uma amostra do revestimento do estômago de Jazz para complementar o tecido disponível. 

No início, a cirurgia de Jazz parecia ter corrido bem, mas pouco tempo depois ela disse ter experimentado “uma dor lancinante”. Ela foi levada de volta ao hospital, onde a Dra. Jess Ting estava à sua espera. “Quando eu estava levando-a para a cama, ouvi algo arrebentando”, disse Ting num episódio de “I Am Jazz”. A nova vagina do Jazz – ou neovagina, como dizem os cirurgiões – tinha se partido.

A disforia de gênero, de que Jazz sofria desde os dois anos de idade, é muito real e, por todos os relatos, excruciante. Durante os quase 100 anos de história dos diagnósticos de disforia de gênero, ela afligia majoritariamente rapazes e homens e começava na primeira infância (idades de dois a quatro anos). De acordo com a última edição do DSM-V, a taxa histórica de incidência foi de 0,01% dos homens (cerca de um em cada 10.000). 

Durante décadas, os psicólogos a trataram com o “watchful waiting” (3), um método de psicoterapia que procura compreender a fonte da disforia de gênero de uma criança, diminuir a sua intensidade e, por fim, ajudar uma criança a crescer mais confortável no seu próprio corpo. 

Uma vez que quase sete em cada 10 crianças inicialmente diagnosticadas com disforia de gênero acabam por superá-la – muitas passam a ser lésbicas ou gays na vida adulta – a sabedoria convencional sustentava que, com um pouco de paciência, a maioria das crianças viria a aceitar os seus corpos. A suposição subjacente era que as crianças nem sempre sabiam o que era melhor para elas.

Mas, na última década, a “espera vigilante” foi suplantada pelos “cuidados afirmativos”, o que pressupõe que as crianças sabem o que é melhor. Os defensores dos cuidados afirmativos exortam os médicos a corroborar a crença dos seus pacientes de que estão presos no corpo errado. A família é pressionada a ajudar a criança a transitar para uma nova identidade de gênero – tendo por vezes sido dito por médicos ou ativistas que, se não o fizerem, o seu filho poderá eventualmente cometer suicídio (4). A partir daí, as pressões recaem sobre os pais para que comecem a dar passos médicos concretos para ajudar as crianças no seu caminho de transição para o corpo “certo”. Isto inclui os bloqueadores da puberdade como passo preliminar. Normalmente, seguem-se os hormônios sexuais cruzados e depois, se desejado, a cirurgia de gênero.

A utilização de bloqueadores da puberdade de maneira geral pode ser rastreada até os Países Baixos. Em meados dos anos 90, Peggy Cohen-Kettenis, uma psicóloga em Amsterdã que tinha estudado jovens com disforia de gênero, ajudou a sensibilizar para os potenciais benefícios dos bloqueadores – anteriormente utilizados na castração química de violentos estupradores. As empresas farmacêuticas tiveram o prazer de financiar estudos sobre a aplicação de bloqueadores em crianças, e, gradualmente, nasceu o chamado Protocolo Holandês. O pensamento por trás do protocolo foi: por que fazer uma criança que sofre de disforia de gênero desde a pré-escola suportar a puberdade, com todos os seus desconfortos e embaraços, se essa criança seria susceptível de transicionar como um jovem adulto? Os investigadores acreditavam que os efeitos dos bloqueadores eram reversíveis – ao menos no caso de a criança acabar não fazendo a transição. 

Mais tarde, Cohen-Kettenis ficou em dúvida sobre essa avaliação inicial. “Ainda não é claro como a supressão puberal irá influenciar o desenvolvimento do cérebro”, escreveu ela no European Journal of Endocrinology em 2006. A puberdade não é apenas um desenvolvimento bioquímico; é também “um evento psicossocial que ocorre em conjunto com os colegas”, me disse o Dr. William Malone, endocrinologista e membro da Society for Evidence Based Gender Medicine (5). Os hormônios não estimulam apenas os órgãos sexuais durante a puberdade; eles também banham o cérebro. 

Mas, no exato momento em que os investigadores holandeses começaram a levantar preocupações sobre os bloqueadores da puberdade, os prestadores de saúde americanos a descobriram (6). Em 2007, o Protocolo Holandês chegou ao Hospital Infantil de Boston, um dos hospitais pediátricos referência da nação. Em breve, se tornaria o principal caminho de tratamento para todas as crianças e adolescentes identificados como transgênero nos Estados Unidos. Uma delas era Jazz Jennings.

Em 2012, um cirurgião implantou um bloqueador da puberdade chamado Supprelin no braço superior de Jazz para atrasar o aparecimento de barba e o engrossamento da sua voz, entre outras coisas. Sem estas características masculinas convencionais, seria mais fácil para os médicos, ao longo do caminho, fazê-la parecer mais feminina – mais parecida com a jovem em formação que ela sentia ser por dentro. 

A essa altura, os médicos sabiam menos do que sabem agora sobre os efeitos dos bloqueadores da puberdade. “Quando se entra num campo como este, onde não há muitos dados publicados, não há muitos estudos e o campo ainda está na sua infância, vê-se por vezes pessoas vendendo protocolos como os bloqueadores da puberdade de uma forma dogmática, como “Isto é exatamente o que fazemos'”, disse-me Bowers.

Uma vez que um adolescente tenha interrompido a puberdade normal e adotado um nome do sexo oposto, Bowers fala: “Você vai à escola socialmente como garota e assume este compromisso. Como é que se volta atrás”?

Outro problema criado pelo bloqueio da puberdade – os especialistas preferem “blockade” a “blockage” – foi a falta de tecido, que os investigadores holandeses notaram em 2008. Nessa altura, Cohen-Kettenis e outros investigadores observaram que, nos nascidos homens, o bloqueio precoce poderia levar ao “crescimento fálico não normal no púbis”, o que significa que “o tecido genital disponível para a vaginoplastia poderia ser inferior ao ótimo”. 

Mas esse aviso de arrepiar os cabelos parece ter se perdido na viagem através do Atlântico.

Muitos cirurgiões de gênero norte-americanos aumentam o tecido para a construção de neovaginas pegando emprestado o revestimento do estômago e até uma amostra do intestino. Bowers fixa seu limite no cólon. “Eu nunca uso o cólon”, disse ela. “É o último recurso. Você pode ter câncer de cólon. Se for usado para fins sexuais, pode adquirir esta colite crônica que exige um tratamento contínuo. É apenas para descarte, tem uma aparência desagradável e não cheira como uma vagina”.

O problema das crianças cuja puberdade foi bloqueada logo no início não é apenas a falta de tecido, mas o desenvolvimento sexual. A puberdade não estimula apenas o crescimento dos órgãos sexuais. Também lhes confere potencial erótico. “Se você nunca teve um orgasmo antes da cirurgia, e se a sua puberdade foi bloqueada, é muito difícil conseguir isso depois”, disse Bowers. “Considero isso, na verdade, um grande problema. É uma espécie de problema negligenciado que no nosso termo de ‘consentimento informado’ para as crianças submetidas a bloqueadores da puberdade, nós em alguns aspectos negligenciamos isso um pouco”.

Também não é um problema que possa ser corrigido cirurgicamente. Bowers pode construir lábios, um canal vaginal e um clitóris e os resultados parecem impressionantes. Entretanto, diz, se as crianças são “orgasmicamente ingênuas” por causa do bloqueio da puberdade, “o clitóris lá em baixo pode até ser [do tamanho de] uma ponta de um dedo e não lhes trazer nenhuma alegria em especial e, portanto, eles não serão capazes de responder enquanto parceiros. E então, como é que isso afeta a sua felicidade a longo prazo”?

Poucos médicos, se é que há algum,  reconhecem isso. A Clínica Mayo, por exemplo, não registra que a disfunção sexual permanente pode estar entre os riscos dos bloqueadores da puberdade. O Hospital Infantil de St. Louis também não a menciona. O Oregon Health & Science University Children ‘s Hospital e a Universidade da Califórnia em San Francisco não o mencionam. Nem houve qualquer menção a disfunção sexual numa matéria recente do New York Times, “O que são bloqueadores de puberdade?”.

Jack Turban, o responsável pela psiquiatria infantil e adolescente da Escola de Medicina da Universidade de Stanford, escreveu, em 2018: “O único efeito secundário significativo é que o adolescente pode ficar para trás na densidade óssea” (7)

Mas a falta de densidade óssea frequentemente é só o início do problema. Os pacientes que tomam bloqueadores da puberdade quase sempre terminam tomando hormônios sexuais cruzados – e esta combinação tende a deixar os pacientes inférteis e, como Bowers deixou claro, sexualmente disfuncionais.

Num episódio de “I Am Jazz”, Jazz revelou que nunca experimentou um orgasmo e que talvez nunca fosse capaz de experimentar. Mas permanece otimista. “Sei que quando eu me apaixonar e admire realmente outro indivíduo, vou querer sexo com ele”, disse Jazz aos 16 anos, num episódio que foi ao ar em julho de 2017.

No ano seguinte à sua operação, Jazz precisou fazer mais três cirurgias e depois adiar a faculdade em Harvard por um ano para lidar com a depressão. Em 2021, abriu o jogo sobre de um transtorno de compulsão alimentar que a fez ganhar quase 100 libras (8) em menos de dois anos.

Jazz insiste que “não se arrependeu” de sua transição. (Eu procurei  Jazz para uma entrevista e nunca tive retorno). Mas sujeitar os pacientes a um curso de intervenções sérias que não podem ser escrutinadas – nem mesmo por especialistas – sem que se corra o risco de ser silenciado como anti-trans tem poucas chances de servir ao melhor interesse de alguém (9).

Bowers me disse que agora acha desaconselhável o bloqueio do início da puberdade. “Não sou mais fã do bloqueio no [ estágio ] Tanner 2, não sou mesmo”, ela me disse, usando o nome clínico do momento em que os primeiros sinais visíveis da puberdade se manifestam  (10). “A ideia parecia boa no começo”, disse ela. “Acreditem, estamos fazendo cirurgias magníficas nestes adolescentes, e eles são tão determinados, e estou tão orgulhosa de muitos deles e dos seus pais. Eles têm sido maravilhosos. Mas, sinceramente, não posso me sentar aqui e te dizer que eles têm resultados melhores – ou mesmo bons. Eles não são tão funcionais. Me preocupo com os seus direitos reprodutivos no futuro. Me preocupo com a sua saúde sexual mais tarde e com a sua capacidade de encontrar intimidade”.

Bowers sabe o que a perda da fertilidade e da intimidade sexual podem ensejar: ela tem três filhos, todos nascidos antes da transição, e passou uma década cuidando de vítimas de mutilação genital feminina. “Essas mulheres, muitas delas experimentam relações pela metade porque elas não conseguem responder sexualmente”, disse ela. “E o meu medo em relação a estes jovens que nunca experimentam o orgasmo antes de serem operados, é que vão chegar à idade adulta, tentar encontrar intimidade e perceber que eles não sabem como responder sexualmente”. 

Em 2007, o ano em que os EUA começaram a implementar o Protocolo Holandês, os EUA tinham uma clínica de gênero pediátrica e ela atendia majoritariamente pacientes como Jazz: meninos biológicos que expressavam desconforto com seus corpos nas primeiras fases da infância. (Aos 2 anos de idade, foi dito que Jazz perguntou a Jeanette quando é que a fada-madrinha o iria transformar numa garota. A própria transição social de Jazz não parecia advir da influência dos pares e dos meios de comunicação social daquela época).

Hoje em dia, os Estados Unidos têm centenas de clínicas de gênero. A maioria dos pacientes não são do sexo masculino, mas sim garotas adolescentes. Escrevi um livro sobre estas garotas, “Danos Irreversíveis”, que foi baseado em entrevistas com elas e as suas famílias. A influência dos colegas e a exposição a influenciadores trans nas redes sociais desempenham um papel de grande dimensão no seu desejo de escapar da mulheridade. Ao contrário dos pacientes do Protocolo Holandês, que foram rastreados para outras comorbilidades de saúde mental (11), estas jovens sofrem quase sempre de ansiedade e depressão graves ou outros problemas de saúde mental relevantes – e esses problemas são frequentemente olhados de maneira superficial ou ignorados.

Quando a pesquisadora da área de saúde pública e ex-professora da Universidade de Brown Lisa Littmann apelidou este fenômeno de “Rapid Onset Gender Dysphoria” [ “ROGD” ], em 2018, a universidade pediu desculpas pelo artigo e acabou por se distanciar dela. Os ativistas chamaram a hipótese de um contágio social entre as adolescentes de uma “uma mentira venenosa usada para desacreditar as pessoas trans (12).

Mas a pesquisa de Littman sobre o pico súbito na trans-identificação de meninas ficou cada vez mais difícil de negar: um inquérito recente da American College Health Association mostrou que, em 2008, uma em cada 2.000 estudantes universitárias se identificava como transgênero. Em 2021, esse número tinha saltado para uma em cada 20.

Ainda que tanto Anderson como Bowers tenham salientado que a ROGD ainda não foi aceita como diagnóstico, Anderson diz: “Na nossa clínica na UCSF, há dois anos em funcionamento, estamos atendendo duas meninas de nascimento para cada nascido menino”. Duas para um.

“Quanto a esta coisa da ROGD, disse Bowers, “penso que provavelmente há pessoas que são influenciadas”. Tem um pouco de “Sim, isso é tão legal. Sim, eu também quero fazer isso””.

Anderson concordou que é provável que vejamos mais arrependimentos na população de meninas adolescentes. “É a minha opinião reflexiva que devido a algumas das – vejamos, como dizê-lo? que palavra escolher? – devido a alguns dos… vou chamar apenas de descuidado, de um cuidado em saúde descuidado, que vamos ter mais jovens adultos se vão se arrepender de ter passado por este processo. E isso vai gerar muitas críticas de alguns colegas, mas dado o que eu vejo – eu lamento, mas é a minha experiência real como psicóloga que trata da juventude com variância de gênero – me preocupa que sejam tomadas decisões que mais tarde serão lamentadas por aqueles que as tomam”.

O que, exatamente, foi desleixado com esses serviços de saúde? “Apressar as pessoas para a medicalização, como você e outros advertiram, e o fracasso – o fracasso nojento – em avaliar o histórico atual de saúde mental de alguém e de prepará-lo para tomar uma decisão que muda tanto a vida”, disse Anderson. 

Perguntei a Bowers sobre o aumento de destransicionadas, mulheres jovens que se arrependeram da transição. Muitas dizem que receberam uma prescrição de testosterona na primeira visita a uma clínica como a Planned Parenthood (13). “Quando se tem uma pessoa designada fêmea no nascimento (14) e ela está se sentindo disfórica, ou alguém decide que ela está disfórica e diz para você que seus transtornos alimentares não são realmente transtornos alimentares mas sim disforia de gênero, e então eles te vêem em uma consulta e recomendam testosterona – sinal vermelho!” diz Bowers. “Acorde!”.

Abigail Shrier é a autora de “Danos Irreversíveis”, que o Economista nomeou como um dos melhores livros de 2020. Leia mais sobre o seu trabalho no seu informativo ”A Fada da Verdade”.

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Notas da equipe No Corpo Certo

  1. A poderosa WPATH é descrita por Felicia Rembrant, do blog 11h Hour, como apenas “um grupo de lobby que chama a si próprio de associação médica”.
  2. “Sweet Sixteen” ou “Doce Dezesseis” é o equivalente nos Estados Unidos e Canadá à nossa festa de 15 anos.
  3. O modelo do “watchful waiting” pode ser traduzido como o da “espera cuidadosa”. No Brasil, ainda que profissionais não utilizassem esse nome, eles certamente o seguiam; diagnósticos médicos de “gênero” em crianças e adolescentes eram raros até o Conselho Federal de Medicina autorizar médicos brasileiros a aplicarem hormônios em menores de idade abaixo dos 18 anos através do Parecer nº 8/2013.
  4. Sobre a ameaça feita aos pais de que seus filhos poderiam se suicidar, publicamos este texto.
  5. O dr. Malone é um endocrinologista que escolheu manter seus princípios éticos; traduzimos uma entrevista com ele no nosso canal (Parte 1 e Parte 2). 
  6. No Brasil, podemos traçar esta história a partir do ano de 2011, com a instauração do Procedimento Administrativo PA NUDDIR nº 115/2011 pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo. O Parecer nº 8/2013 do CFM viria em resposta a uma consulta desse mesmo órgão.
  7. Jack Turban é um dos mais agressivos defensores do bloqueio puberal em ambulatórios de “gênero”. O Uncommon Ground Media descobriu o motivo: ele era financiado pelo laboratório Arbor, que comercializa uma das marcas de bloqueador, o Triptodur. 
  8. Em quilos, 100 libras equivalem a 45,36 kg.
  9. Na verdade, é sim do interesse de pessoas que ganham dinheiro vendendo serviços estéticos de modificação corporal que crianças, adolescentes e adultos se submetam a estes serviços. Da mesma forma, é do interesse de adultos que se autodeclaram “trans” (seja por autoginefilia, dificuldade de aceitação da própria orientação sexual ou outras questões) se autolegitimarem através das crianças.
  10. O Tanner 2 é o estágio em que os primeiros sinais de puberdade aparecem. Médicos brasileiros hormonizam crianças nesse momento desde 2013; primeiro, com base no citado Parecer n° 8/2013 do CFM e, atualmente, com base na  Resolução nº 2265/19, do Conselho Federal de Medicina. Conforme diz o art. 8, § 2, da Resolução: “Em crianças ou adolescentes transgêneros, o bloqueio hormonal só poderá ser iniciado a partir do estágio puberal Tanner II (puberdade), sendo realizado exclusivamente em caráter experimental em protocolos de pesquisa, de acordo com as normas do Sistema CEP/Conep, em hospitais universitários e/ou de referência para o Sistema Único de Saúde”.
  11. Questionamos a validade deste “rastreamento”; afinal, diversas questões de saúde mental só costumam aflorar no início da idade adulta, como a esquizofrenia. 
  12. Nós publicamos no nosso canal um vídeo de um psicólogo no qual ela entrevista a mãe de uma menina com ROGD (“rapid onset gender dysphoria” ou “disforia de gênero de surgimento repentino”); clique aqui  para assistir. Assim como aconteceu lá fora, o transativismo brasileiro também tentou desacreditar a existência da ROGD e outros questionamentos acerca do tema. A dupla de psicanalistas Marco Antônio Coutinho Jorge e Natália Travassos (autores do artigo “A epidemia transexual: histeria na era da ciência e da globalização?”e do livro “Transexualidade – corpo entre o discurso e a ciência”) foi atacada pela ANTRA – Associação Nacional de Travestis e Transexuais, que chegou a exigir a retirada do livro da lista de concorrentes ao Prêmio Jabuti. Em seu site, a organização assim se manifestou: “Como afirmou a ativista transfeminista Beatriz Bagagli, ao analisar a referida obra, o que esses psicanalistas estão fazendo é reforçar uma perspectiva ´tão prejudicial e estigmatizante para a população trans, pois oferece a legitimação do discurso de que os direitos trans estariam ´indo longe demais  – quando na verdade não estaríamos nem no começo. Posicionamentos como desses dois psicanalistas conferem legitimidade a interpretações estigmatizantes sobre pessoas trans, algo muito distante da escuta atenta e ética defendida pela psicanálise”.
  13. A Planned Parenthood é uma rede de clínicas norte-americana de preços populares. Lá, o empuxo é tão intenso que até algumas universidades fornecem subsídios para a compra de hormônios cruzados. No Brasil, como você sabe, o SUS financia ambulatórios de “identidade de gênero”.
  14. A medicina da “identidade de gênero” se baseia em pseudociência; afinal, não existe comprovação de que teríamos uma “identidade de gênero” e obviamente seres humanos não mudam de sexo. Assim, os termos originados dela são igualmente pseudocientíficos: “transexual”, “transgênero”, “cisgênero”, “mulher trans”, “homem trans” e  “sexo designado no nascimento” – como se o sexo fosse arbitrariamente decidido pelo profissional que fez o parto.